domingo, agosto 27, 2006
Isidoro Augusto
ISIDORO
AUGUSTO
ou
a metamorfose do vazio
por
ANTÓNIO RAMOS ROSA
Nestes desenhos foto-gráficos de Isidoro Augusto não há nada de
simbólico, alegórico ou metafórico. É que eles nada representam ou
figuram, pois são um puro acto cujo objecto é a sua própria génese.
Pode dizer-se que este acto é uma afirmação do vazio enquanto
lugar da aparição da forma. Assim, a forma surge do vazio no
limite em que a sua emergência é a própria formação
do vazio. O artista deixa de representar seja o que for para se encontrar
face ao visível na sua pureza integral, sem a alienação de qualquer ponto
de vista. Este espaço visível mostra-nos então
a invisibilidade do ser.
Num certo sentido, tudo o que eu apreendo ou contenho, só o
compreendo se souber que é algo inapreensível e que eu posso deixar
ser. Só assim a infinidade se revela na sua invisibilidade, na plenitude do
vazio. Esta experiência é fundamental porque se trata de uma forma de
conhecimento do absoluto. Será este o sentido destes
desenhos, dos quais não se pode dizer que tenham um tema ou
reproduzam um objecto (real ou
imaginário)? O essencial neles seria o vazio, o espaço de que nasce o
sentido ou o não-sentido - ou o que transcende o sentido.
Na verdade, a imagem nestes desenhos não reenvia a uma realidade
exterior ou interior, não é uma representação de um fragmento do visível
recortado na experiência quotidiana; é antes um modelo de organização
do espaço, conjunto de puros signos sem referência ou qualquer
sugestão figurativa. Assim, neles nada se
significa, nada se revela a não ser o tema estrutural que constitui a figura
ou a imagem do desenho, a qual está para além de qualquer
interpretação. Há, talvez, em cada delicada marca, traço ou mancha, ou
em cada sombra destas manchas, ou ainda nas linhas que se rompem
em minúsculos intervalos, há nestas marcas e nestas falhas,
talvez, uma subtil encarnação do desejo ou o
frémito de um corpo desejante. Todavia, este frémito não se torna tema
ou figura, uma vez que se inscreve na
metamorfose do invisível ou na formulação pictórica de um espaço puro.
De certo modo, o que Isidoro Augusto faz é dissociar as significações
estabelecidas em partículas
in-significantes, mostrando-as e relacionando-as em novas estruturas,
que não requerem o sentido institucionalizado, porque são abertas e
totalmente vazias. Por outros termos, estes desenhos fotográficos de
Isidoro Augusto são menos significativos do que
dessignificantes e é essa abertura
estrutural, a sua delicadíssima complexidade ou a sua
subtil simplicidade, a sua transparência, que os
tornam extremamente sugestivos e
reveladores de um puro espaço em que a visão se alia à
metamorfose do vazio.
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