IMAGEM REFLECTIDA
Inventara-a,
não sendo pois o que era
mas o que nela vira.
E essa imagem vivia nele,
e nele durava como um
súbito acordar ofegante
em meio da noite,
uma lembrança de morte.
Na queda quebrou-se
o modelo.
A imagem leva-a ele:
um peso morto,
uma mágoa inútil.
Rui Knopfli
Obra Poética
1 comentário:
RUI KNOPFLI
[Inhambane/Moçambique, 1932 - Lisboa, 1997]
Poeta. Natural de Inhambane, viveu em Moçambique atĂ© 1975. A famĂlia transferiu-se em 1934 para Lourenço Marques, onde fez estudos secundários que prolongou em Joanesburgo, na Ă�frica do Sul. Foi delegado de propaganda mĂ©dica (1958-74) e, ao mesmo tempo, uma das figuras mais destacadas da vida cultural daquela antiga colĂłnia. NĂŁo tinha ainda dezassete anos quando começou a colaborar no Itinerário, mensário de oposição ao regime. Sobre o livro de estreia, O PaĂs dos Outros (1959), AntĂłnio Ramos Rosa escreveu, na Seara Nova, que "a sua voz destaca no concerto da poesia dos Ăşltimos anos, pela agressividade corrosiva, pela maneira directa com que fixa a realidade social e os seus prĂłprios sentimentos, pelo sarcasmo com que a vitupera, pela rudeza viril". Colaborou activamente na imprensa desafecta Ă administração colonial, casos de A Tribuna - jornal de que viria a ser um polĂ©mico director, entre Maio de 1974 e Fevereiro de 1975 - e A Voz de Moçambique. Nos anos sessenta e setenta, respectivamente, co-dirigiu, com EugĂ©nio Lisboa, os suplementos literários destes dois jornais. Lançou, com JoĂŁo Pedro Grabato Dias, os cadernos de poesia Caliban (1971-72), que reuniram colaboradores como Jorge de Sena, Herberto Helder, AntĂłnio Ramos Rosa, Fernando Assis Pacheco, JosĂ© Craveirinha, SebastiĂŁo Alba, etc. Dirigiu o caderno "Letras & Artes" (1972-75), da revista Tempo, ali tendo publicado traduções de inĂşmeros poetas, como, entre outros, T. S. Eliot, Blake, Sylvia Plath, Kavafis, Dylan Thomas, Yeats, Robert Lowell, Pound, RenĂ© Char, Apollinaire, Octavio Paz e Reverdy. Integrado, como adido de imprensa, na delegação portuguesa Ă Assembleia-Geral das Nações Unidas, participa em Nova Iorque (1974) dos trabalhos da ComissĂŁo de Descolonização. A forma como dirigiu A Tribuna, ao arrepio das orientações marxistas do alto-comissário portuguĂŞs e do governo de transição, e, do mesmo passo, contrariando as teses da minoria secessionista branca (responsável pelo "pronunciamento" racista de 7 de Setembro de 1974), fizeram de Rui Knopfli um homem a abater. Demite-se do jornal, por objecções de natureza Ă©tica, e deixa Moçambique em Março de 1975. Voltará ao paĂs de origem uma Ăşnica vez, em Outubro de 1989. Faz parte de uma geração de moçambicanos expatriados, que inclui os poetas Alberto de Lacerda, Helder Macedo e VirgĂlio de Lemos, o cineasta Ruy Guerra, os filĂłsofos Fernando Gil e JosĂ© Gil, o arquitecto Pancho Miranda Guedes, o fotĂłgrafo Pepe Diniz, a pintora Bertina Lopes e o ensaĂsta EugĂ©nio Lisboa. A publicação de MemĂłria Consentida (1982) permite revelar ao pĂşblico portuguĂŞs a estatura do poeta. Numa boa sĂntese, LuĂs de Sousa Rebelo faz notar que "a sua poesia nĂŁo Ă© fácil de arrumar dentro [de] critĂ©rios escolásticos" e que Ă© "uma poesia dramática, de alusĂŁo maliciosa e de ritmos subtis, sinuosa e sedutora na sondagem dos fundões da psique, e deve ser lida sem prevenções de leituras anteriores, na omnĂmoda e indisfarçada complexidade do seu texto". Em 1984 recebeu o prĂ©mio de poesia do PEN Clube. Em Portugal tem colaboração dispersa no JL e nas revistas ColĂłquio-Letras e Ler. Encontra-se representado em algumas antologias, designadamente em Contemporary Portuguese Poetry (Manchester, 1978) e no The Penguin Book of Southern African Verse (Londres, 1989). Radicado em Londres desde Julho de 1975, exerceu, durante vinte e dois anos consecutivos, o cargo de conselheiro de imprensa (1975-97) junto da Embaixada de Portugal na capital britânica. Em Bruxelas foi publicado Le Pays des Autres (1995), volume que colige os trĂŞs primeiros livros. Poeta bipátrida, da sua obra pode-se dizer, com palavras suas: "Tenho sĂł este exĂguo e perplexo pecĂşlio/ de palavras Ă beira do silĂŞncio".
in Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, Vol. VI, Lisboa, 1999
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