quinta-feira, novembro 30, 2006

José Agostinho Baptista

NÃO SEI

Não sei quanto tempo ficarei aqui, junto a
esta janela.
Imagino os fogos-de-santelmo,
a aurora boreal,
o mistério das três-marias,
e de vez em quando há uma sirene que me
lembra como é breve a viagem entre tudo e
quase nada.

Agora, que parti,
deita-se sobre as terras da noite a minha
vida magoada.
Diz-me:
que farei ao piano das casas desoladas?
Que estranhos seres dançam silenciosamente
em plena madrugada?
Quem ordena o princípio das tempestades?

Os náufragos apareciam depois, com a cor
que traziam dos lilases.
Nunca mais as noivas do mar regressaram à
capela onde rezavam à Senhora dos
navegantes e dos solitários.
Nunca mais te vi.

Junto a esta janela,
penso nos recifes, nos cabos do medo.
Ao anoitecer,
os faróis iluminam os promontórios.

Subitamente, é demasiado tarde.

Está sempre frio aqui,
no peitoril onde uma vela arde, desde cedo
como se ardesse nos insondáveis templos
muito além.


José Agostinho Baptista
Esta voz é quase o vento
Assírio & Alvim

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