O fogo que na branda cera ardia,
Vendo o rosto gentil que eu na alma vejo,
Se acendeu de outro fogo do desejo,
Por alcançar a luz que vence o dia.
Como de dous ardores se incendia,
Da grande impaciência fez despejo,
E, remetendo com furor sobejo,
Vos foi beijar na parte onde se via.
Ditosa aquela flama, que se atreve
A apagar seus ardores e tormentos
Na vista de que o mundo tremer deve!
Namoram-se, Senhora, os Elementos
De vós, e queima o fogo aquela neve
Que queima corações e pensamentos.
Luís Vaz de Camões
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LuĂs Vaz de Camões (c. 1524 - 10 de Junho de 1580) Ă© considerado o maior poeta de lĂngua portuguesa e dos maiores da Humanidade. O seu gĂ©nio Ă© comparável ao de VirgĂlio, Dante ou Shakespeare. Das suas obras, a epopeia Os LusĂadas Ă© a mais significativa.
Camões teria nascido em Lisboa por volta de 1524, de uma famĂlia de origem galega que se fixou primeiro no Norte (Chaves) e depois irradiou para Coimbra e Lisboa. Foi seu pai SimĂŁo Vaz de Camões e mĂŁe Ana de Sá e Macedo. Por via paterna, Camões seria trineto do trovador galego Vasco Pires de Camões, e por via materna, aparentado com o navegador Vasco da Gama.
Entre 1542 e 1545, vive em Lisboa, trocando os estudos pelo ambiente da corte de D. JoĂŁo III, conquistando fama de poeta, e feitio altivo.
Viveu algum tempo em Coimbra onde teria frequentado o curso de Humanidades, talvez no Mosteiro de Santa Cruz, onde tinha um tio padre D. Bento de Camões. Não há registos da passagem do poeta por Coimbra. Em todo o caso, a cultura refinada dos seus escritos torna a única universidade de Portugal do tempo como o lugar mais provável de seus estudos. Ligado à casa do Conde de Linhares, D. Francisco de Noronha, e talvez preceptor do filho D. António, segue para Ceuta em 1549 e por lá fica até 1551. Era uma aventura comum na carreira militar dos jovens, recordada na elegia Aquela que de amor descomedido. Num cerco, teve um dos olhos vazados por uma seta pela fúria rara de Marte. Ainda assim, manteve as suas potencialidades de combate.
De regresso a Lisboa, nĂŁo tarda em retomar a vida boĂ©mia. SĂŁo-lhe atribuĂdos vários amores, nĂŁo sĂł por damas da corte mas atĂ© pela prĂłpria irmĂŁ do Rei D. Manuel I. Teria caĂdo em desgraça, a ponto de ser desterrado para Constância. NĂŁo há, porĂ©m, o menor fundamento documental. No dia do Corpo de Deus de 1552 entra em rixa, e fere um certo Gonçalo Borges. Preso, Ă© libertado por carta rĂ©gia de perdĂŁo de 7.3.1552, embarcando para a ĂŤndia na armada de FernĂŁo Ă�lvares Cabral, a 24 desse mesmo mĂŞs.
Chegado a Goa, Camões toma parte na expedição do Vice-Rei D. Afonso de Noronha contra o Rei de Chembe. A esta primeira expedição se refere a elegia O Poeta SimĂłnides falando. Depois Camões fixa-se em Goa onde escreveu grande parte da sua obra Ă©pica. Considerou a cidade como uma madrasta de todos os homens honestos. Lá estudou os costumes de cristĂŁos e hindus, e a geografia e a histĂłria locais. Toma parte em mais expedições militares. Entre Fevereiro e Novembro de 1554 vai na armada de D. Fernando de Meneses, ao Mar Vermelho, aĂ sentindo a amargura expressa na canção Junto de um seco, fero e estĂ©ril monte. No regresso Ă© nomeado "provedor-mor dos defuntos nas partes da China" pelo Governador Francisco Barreto, para quem escreveria o Auto do Filodemo. Em 1556 parte para Macau, onde continuou os seus escritos. Vive numa cĂ©lebre gruta com o seu nome e por aĂ terá escrito boa parte de "Os LusĂadas". Naufragou na foz do rio Mekong, onde conservou de forma herĂłica o manuscrito dos LusĂadas entĂŁo já adiantados (cf. Lus., X, 128). No naufrágio teria morrido a sua companheira chinesa Dinamene, celebrada em sĂ©rie de sonetos. É possĂvel que datem igualmente dessa Ă©poca ou tenham nascido dessa dolorosa experiĂŞncia as redondilhas SĂ´bolos rios.
Regressa a Goa antes de Setembro de 1560 e pede a protecção do Vice-Rei D. Constantino de Bragança num longo poema em oitavas. Aprisionado por dĂvidas, dirige sĂşplicas em verso ao novo Vice-Rei, D. Francisco Coutinho, Conde do Redondo, para ser liberto. Em 1567, vem para Moçambique, onde, passados dois anos, Diogo do Couto o encontrou, como relata na sua obra, acrescentando que o poeta estava "tĂŁo pobre que vivia de amigos". (DĂ©cada 8.ÂŞ da Ă�sia). Trabalhava entĂŁo na revisĂŁo de Os LusĂadas e na composição de "um Parnaso de LuĂs de Camões, com poesia, filosofia e outras ciĂŞncias", obra roubada. Diogo do Couto pagou-lhe a viagem atĂ© Lisboa, onde Camões aportou em 1569.
Os LusĂadas sĂŁo considerados a principal epopeia da Ă©poca moderna devido Ă sua grandeza e universalidade. As realizações de Portugal desde o Infante D. Henrique atĂ© Ă uniĂŁo dinástica com Espanha em 1580 sĂŁo um marco na HistĂłria, marcando a transição da Idade MĂ©dia para a Época Moderna. A epopeia narra a histĂłria de Vasco da Gama e dos herĂłis portugueses que navegaram em torno do Cabo da Boa Esperança e abriram uma nova rota para a ĂŤndia. É uma epopeia humanista, mesmo nas suas contradições, na associação da mitologia pagĂŁ Ă visĂŁo cristĂŁ, nos sentimentos opostos sobre a guerra e o impĂ©rio, no gosto do repouso e no desejo de aventura, na apreciação do prazer e nas exigĂŞncias de uma visĂŁo herĂłica.
A obra lĂrica de Camões foi publicada como "Rimas", nĂŁo havendo acordo entre os diferentes editores quanto ao nĂşmero de sonetos escritos pelo poeta e quanto Ă autoria de algumas das peças lĂricas. Alguns dos seus sonetos, como o conhecido Amor Ă© fogo que arde sem se ver, pela ousada utilização dos paradoxos, prenunciam já o Barroco que se aproximava.
Obras
* 1572- Os LusĂadas
Rimas
* 1595 - Amor Ă© fogo que arde sem se ver
* 1595 - Eu cantarei o amor tĂŁo docemente
* 1595 - Verdes sĂŁo os campos
* 1595 - Que me quereis, perpétuas saudades?
* 1595 - Sobolos rios que vĂŁo
* 1595 - Transforma-se o amador na cousa amada
* 1595 - Sete anos de pastor Jacob servia
* 1595 - Alma minha gentil, que te partiste
* 1595 - Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades
Teatro
* 1587 - El-Rei Seleuco
* 1587 - Auto de Filodemo
* 1587 - Anfitriões
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