QUANDO SÓS À BOLEIA DO CREPÚSCULO
[para o Fernando Guerreiro]
Não mais a literatura, os seus
fúteis e imperiosos desígnios- julgamos dizer, insistindo
numa ourivesaria do terror
e em gestos que sabem o quanto
chegam tarde. Quando sós,
à boleia do crepúsculo, dizemos
coisas assim, mentimos como
s dentes todos que não temos.
E a mentira (a literatura)
é ainda a improvável derrota
de que não nos salvaremos
nunca. Tão igual à vida, portanto:
pouso o copo, recupero o fôlego,
fumo uma silepse. Sei que vou morrer.
E isso que - talvez - nos diz
é uma evidência que escurece
(tivemos por amigo o desconforto).
Quanto ao mais, vamos andando.
Casados ou sozinhos. Mortos.
Manuel de Freitas
[SIC]
poesia inédita portuguesa
Assírio & Alvim
1 comentário:
Manuel de Freitas nasceu em 1972, no Vale de Santarém, tendo publicado o seu primeiro livro de poemas em 2000: Todos Contentes e Eu Também, Campo das Letras. Em 1999 havia já publicado A Noite dos Espelhos, na editora frenesi, um breve ensaio sobre a poesia de Al Berto. Poeta de invulgar proficuidade, escreve regularmente sobre livros no semanário Expresso e tem colaboração dispersa em várias revistas literárias portuguesas. É um dos directores da revista Telhados de Vidro, publicação da editora Averno que o próprio dirige. Em 2002 organizou a antologia Poetas sem Qualidades, obra breve que acabaria por contribuir para uma acesa polémica sobre os trilhos da poesia portuguesa surgida na década de 1990.
(agradeço a HMBF)
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