sábado, setembro 29, 2007

Mário Henrique Leiria

CANÇÃO DA MANHÃ


como os estranhos pássaros nascidos em tua boca
como os rios que te correm entre os olhos
como as esmeraldas que formam as asas dos teus ombros
como os longos ramos da árvore do sono do teu braço
como o grande espaço em que o teu corpo repousa
deitado na tua própria mão
como a tua sombra idêntica à nuvem
que se encontra com o mar
assim é a presença que de ti tenho
nas noites em que o fogo se acende
nas montanhas longínquas e fulgurantes
quando os meus passos me projectam
para os mais elevados cumes solitários
quando o sangue canra
através do aço vibrante do meu corpo
levando-me ao longo do caminho de flores rubras
que tu plantaste
assim é o desejo de te encontrar
nascida nas minhas mãos
erguida como torre duma catedral perdida
envolta na minha boca
caminhando comigo
pela estrada que nossos pés abrirão triunfantes


MÁRIO HENRIQUE LEIRIA (1923-1980)
A Única Real Tradição Viva
Antologia da Poesia Surrealista Portuguesa
(organização de Perfecto E. Cuadrado)

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