A uma pergunta aparentemente tão singela como “A ciência
terá limites?”, só se pode responder de modo igualmente
singelo: depende. Isto é, os limites dependem da maneira
como a ciência é encarada, pois a ciência resulta da tentativa
de melhor compreender a realidade em que nos encontramos
imersos, uma realidade tão multifacetada quanto complexa.
Em primeiro lugar, a ciência pode ser considerada como
um domínio do conhecimento. Nesta perspectiva, a ciência
dedica-se ao estudo dos fenómenos da Natureza e das suas
interacções. Sendo o Universo infinito, o processo de o apreendermos
não pode ser limitado. O progresso da ciência, neste
quadro, não conhece limites.
Mas podemos igualmente observar que, sendo a ciência
um domínio do conhecimento, ela exprime-se e comunica-se
de maneira semelhante à dos outros domínios, isto é, usando
linguagens especializadas. Nestes termos, a precisão da
descrição da realidade e dos seus fenómenos está condicionada
à pertinência dessas linguagens e dos seus componentes
(a música, por exemplo, não se traduz bem por palavras).
Nesta perspectiva, os limites surgem da incapacidade de
inventar novas linguagens.
Por outro lado, a especialização crescente acarreta uma
progressiva fragmentação das disciplinas científicas e um
distanciamento cada vez maior em relação aos outros domínios
do conhecimento. Os limites da ciência corresponderão
neste caso às fronteiras cognitivas dos outros domínios,
que serão tanto mais inultrapassáveis quanto o esforço
de comunicação interdisciplinar se tornar desaconselhado,
ou mesmo proscrito.
Mas a ciência não se pode fazer, nem praticar, sem cientistas.
Nesta medida, poder-se-á afirmar que os limites societais
impostos à liberdade de acção das comunidades científicas
serão determinantes para o desenvolvimento futuro da
ciência. Essas barreiras, resultantes das percepções sobre
o valor da ciência para as economias e as sociedades em
que essas comunidades se inserem, são uma das mais fortes
condicionantes das nossas possibilidades de adaptação
e de ajustamento a novas situações e condições de vida.
Espero, com esta enumeração simples de limites, condições,
barreiras e constrangimentos, ter despertado o apetite e o
interesse para a discussão das várias atitudes e posições
que não deixarão de ser apresentadas pelos oradores convidados
na Conferência Internacional de 25 e 26 de Outubro
próximo. Veremos certamente como as humanidades,
as ciências sociais e os diversos ramos da ciência encaram
a questão posta consoante as estratégias de descoberta
e as visões do mundo de que são portadoras.
Sobretudo, esta oportunidade de diálogo deverá permitir
uma reflexão sobre o limite fundamental da nossa aventura
como espécie biológica no planeta – a imaginação. Porque
é a imaginação que nos faz sonhar. E transformar os sonhos
em realidade. ■
por João Caraça
http://www.gulbenkian.org/v1/newsletters/87.pdf
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