terça-feira, maio 23, 2006

Nada de novo na frente ocidental



Nada de novo na frente ocidental chegou-me numa "herança".
Gasto, sem capa, sem data de publicação.


Passam os meses. Êste verão de 1918 é o mais
doloroso e o mais sangrento de todos. Os dias são
como anjos vestidos de azul e ouro, pairando impas-
síveis sôbre o campo da morte. Todos sabemos que
perderemos a guerra. Não se fala muito nisso. Re-
cuamos; depois desta grande ofensiva, não pode-
remos atacar ; já não temos soldados nem munições.
Todavia, a luta continua, continua-se a morrer...
Verão de 1918... Nunca, a vida, na sua miserável
encarnação, nos pareceu tão desejável como agora:
papoulas vermelhas dos prados dos nossos acampa-
mentos de repouso, brilhantes insectos sôbre tufos
de hervas, tardes quentes nos quartos frescos e na
penumbra; árvores negras e misteriosas ao crepús-
culo, estrêlas e águas correntes, sonhos e longos
sonos, ó vida, vida, vida!...

Verão de 1918... Nunca se sofreram em silêncio
tantas dores como na hora de partir para a primeira
linha. Os tão excitantes falsos boatos de armistício
e de paz brotam, sobressaltam os corações e tornam
as partidas mais dolorosas do que nunca.
Verão de 1918... Nunca a vida na frente foi mais
amarga nem mais atroz que durante as horas passa-
das debaixo de fogo, quando as caras lívidas estão
deitadas sôbre a lama e as mãos se crispam num
único protesto: - Não, não, não, ainda não! Ainda
não, pois isto vai acabar!

Verão de 1918... Vento de esperança que acaricia;
os campos devastados pela metralha, febre ardente
da impaciência e da decepção, arrepio doloroso da
morte. Uma pregunta incompreensível:
- Porquê! Porque não se acaba com isto ? E por-
que correm estes boatos anunciando o fim?


Nada de novo na frente ocidental
Erich Maria Remarque
Tradução de Acúrcio Pereira
Quinta edição
Livrarias Aillaud e Bertrand
Lisboa

1 comentário:

Anónimo disse...

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