domingo, junho 29, 2008

Corpo e Alma

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Corpo e Alma

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Corpo e Alma

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"Corpo e Alma"







"Corpo e Alma", ópera de Christopher Bochmann, baseada na peça Pedro, o Crú, de António Patrício.
Ontem, estreia mundial, no S. Carlos


terça-feira, junho 24, 2008

Cy Twombly

Cy Twombly
Wilder Shores of Love
1985
Na Tate Gallery e no Museu do Prado, por altura do seu 80.º aniversário

intelligent life


Um belíssimo número de The Economist que traz a grande arquitecta Zaha Hadid e a vida dos que permanecem activos por muito tempo.

domingo, junho 22, 2008

sexta-feira, junho 13, 2008

Letra D - David Mourão Ferreira

GRITO

Cedros, abetos,
pinheiros novos.
O que há no tecto
do céu deserto,
além do grito?
Tudo que é nosso.

São os teus olhos
desmesurados,
lagos enormes,
mas concentrados
nos meus sentidos.
Tudo o que é nosso
é excessivo.

E a minha boca,
de tão rasgada,
corre-te o corpo
de pólo a pólo,
desfaz-te o colo
de espádua a espádua,
são os teus olhos,
depois o grito.

Cedros, abetos,
pinheiros novos.
É o regresso.
É no silêncio
de outro extremo
desta cidade
a tua casa.
É no teu quarto
de novo o grito.

E mais nocturna
do que nunca
a envergadura
das nossas asas.
Punhal de vento,
rosa de espuma:
morre o desejo,
nasce a ternura.
Mas que silêncio
na tua casa.

David Mourão Ferreira


AVISO DE MOBILIZAÇÃO

Passaram pelo meu nome e eu era um número
Menos que a folha seca de um erbário
Colheram-no com mãos de zelo e gelo
Escreveram-me sem mágoa um postal.
Convite a que morresse... mas porquê?
Convite a que matasse... mas por quem?
Oh! vago amanuence...
Oh! apressado e súbito verdugo...
Que te ocultas numa rubrica rápida e legível...
Que dirás tu do meu e doutros nomes
Que dirás tu de mim e doutros mais
No Dia do Juízo já tão próximo?
Que dirás tu de nós se nem treme
Na rápida rubrica a tua mão?
Bem sei que a tua mão só executa
Mas além do ombro a ti pertences.
Porém, pudera chorar, ter hesitado
A mancha de uma lágrima bastara
Para dar um sentido a esta morte
A que a tua indiferença nos convoca.

David Mourão-Ferreira


Testamento

Que fique só da minha vida
um monumento de palavras
Mas não de prata Nem de cinza
Antes de lava Antes de nada
Daquele nada que se aviva
quando se arrisca uma viagem
por entre os pântanos da ira
além do sol das barricadas
Ou quando um poço que cintila
parece o tecto de uma sala
Ou quando importa que se extinga
dentro de nós a inexacta
irradiação que vem das criptas
em que o azul nos sobressalta
em que à penumbra se diria
que se acrescenta o som das harpas
Ou quando a terra não expira
senão segredos feitos de água
Ou quando a morte nos avisa
Ou quando a vida nos agarra ...

... É quando o poeta menos grita
que mais se crê nas suas lágrimas
Fique porém de quanto sinta
um monumento de palavras

David Mourão Ferreira
Excerto


A CAVALO NO VENTO

A cavalo no vento sobrevoo
o destino sombrio deste porto,
aonde um rio vem morder o vulto
do mar confuso.
Ó mar despedaçado,
mordido em tanto flanco, o sobressalto
dos teus ombros nervosos já sacode
a terra toda!

E para quê mais portos
agressores, estaleiros rancorosos,
onde em surdina e sombra se conspira
contra a vida. . .?

. . . Contra a vida do mar e o seu poder
que só um corpo nu deve merecer!

David Mourão Ferreira
Canto II
Os Quatro Cantos do Tempo
(1953-1958)
Obra Poética
1948-1988
4.º Edição
Editorial Presença

OS CAVALOS

Que venerável campo que era o mundo!
Que venerável campo! E nós que lhe fizemos?
Nas escarpas
nos cômoros
nos vales
já não levantam ouro os cascos dos cavalos!

(Esses aí puxavam
a quadriga de Apolo.
Ficaram sem emprego: o Sol está parado.
Além, o Rocinante. O Pégaso, mais alto.
Limitam-se ao convívio
dos outros reformados:
os cavalos solenes dos enterros
os cavalos festivos das paradas
os cavalos heróicos das batalhas!)

Cavalos, ah! somente o vento vos cavalga!
E são bandos, são tantos e são tristes
sem cavaleiros, nem sequer fantasmas!
(Faltam, contudo, quatro.
De Quatro Cavaleiros que hão-de vir.
A promessa é formal e serão quatro.
Quatro.
Quando virão
remir-nos e remir-vos?)

E entanto que merecido insulto se preferissem
a seus corcéis de luz
quatro aviões a jacto!


David Mourão Ferreira
Canto IV
Os Quatro Cantos do Tempo
(1953-1958)
Obra Poética
1948-1988
4.º Edição
Editorial Presença



LABIRINTO OU NÃO FOI NADA

Talvez houvesse uma flor
aberta na tua mão.
Podia ter sido amor,
e foi apenas traição.

É tão negro o labirinto
que vai dar à tua rua. . .
Ai de mim, que nem pressinto
a cor dos ombros da Lua!

Talvez houvesse a passagem
de uma estrela no teu rosto.
Era quase uma viagem:
foi apenas um desgosto.

É tão negro o labirinto
que vai dar à tua rua...
Só o fantasma do instinto
na cinza do céu flutua.

Tens agora a mão fechada;
no rosto, nenhum fulgor.
Não foi nada, não foi nada:
podia ter sido amor.

David Mourão Ferreira
À Guitarra e à Viola
(1954-1960)
Obra Poética
1948-1988
4.º Edição
Editorial Presença


CASA

Tentei fugir da mancha mais escura
que existe no teu corpo, e desisti.
Era pior que a morte o que antevi:
era a dor de ficar sem sepultura.

Bebi entre os teus flancos a loucura
de não poder viver longe de ti:
és a sombra da casa onde nasci,
és a noite que à noite me procura.

Só por dentro de ti há corredores
e em quartos interiores o cheiro a fruta
que veste de frescura a escuridão. . .

Só por dentro de ti rebentam flores.
Só por dentro de ti a noite escuta
o que sem voz me sai do coração.

David Mourão Ferreira
Infinito Pessoal
(1959-1962)
Obra Poética
1948-1988
4.º Edição
Editorial Presença



XXV

Quantos em ti lagos e rios
Quantos em ti os oceanos

Água vermelha que aos ouvidos
traz o aviso
de nenhuns campos

É bom sondarmos os abismos
que nunca vão cicatrizando

E ao som da água pressentirmos
de onde provimos
aonde vamos

David Mourão Ferreira
O Corpo Iluminado
(1987)
Obre Poética
1948-1988
4.º Edição
Editorial Presença



É como se tivesses mãos ou garras
milhões de dedos braços infinitos
É como se tivesses também asas
libertas do minério dos sentidos
É como se nos píncaros pairasses
quando nas nossas veias é que vives
É como se te abrisses - ó terraço
rodeado de abutres e raízes -
sobre o perene pânico dos astros
sobre a constante insónia dos abismos
E é como se te abrisses e fechasses
sobre a antepalavra do Espírito
É como se morresses quando nasces
É como se nascesses quando expiras

II

Ó claridade Ó vaga Ó luz Ó vento
que no sangue desvendas labirintos
Ó varanda no mar sempre Setembro
Ó dourada manhã sempre Domingo
Ó sereia nas dunas irrompendo
com as dunas e o mar se confundindo
Ó corpo de desperta adolescente
já no centro de incógnitos caminhos
que por fora te aceitas e por dentro
pões em dúvida o sol do teu fascínio
Ó dúvida que avanças mas por entre
volutas de pavor que vais cingindo
Ó altas labaredas Ó incêndio
Ó Musa a renascer das próprias cinzas

III

Só tu a cada instante nos declaras
que renegas a voz de quem divide
Que a única verdade é haver almas
terrível impostura haver países
Que tanto tens das aves o desgarre
como o expectante frémito do tigre
tanto o céu indiviso que há nas águas
quanto o múltiplo fogo que há no trigo
Que és igual e diversa em toda a parte
Que és do próprio Universo o que o sublima
Que nasces que te apagas que renasces
em procura da límpida medida
Que reges o mais puro e o mais alto
do que Deus concedeu às nossas vidas

David Mourão Ferreira
Ode à Música
Obra Poética
1948-1988
4.º Edição
Editorial Presença

Pessoa e as suas pessoas


Fernando Pessoa por Almada Negreiros

A Frescura

Ah a frescura na face de não cumprir um dever!
Faltar é positivamente estar no campo!
Que refúgio o não se poder ter confiança em nós!
Respiro melhor agora que passaram as horas dos encontros,
Faltei a todos, com uma deliberação do desleixo,
Fiquei esperando a vontade de ir para lá, que'eu saberia que não vinha.
Sou livre, contra a sociedade organizada e vestida.
Estou nu, e mergulho na água da minha imaginação.
E tarde para eu estar em qualquer dos dois pontos onde estaria à mesma hora,
Deliberadamente à mesma hora...
Está bem, ficarei aqui sonhando versos e sorrindo em itálico.
É tão engraçada esta parte assistente da vida!
Até não consigo acender o cigarro seguinte... Se é um gesto,
Fique com os outros, que me esperam, no desencontro que é a vida.

Álvaro de Campos






Bocas Roxas




Bocas roxas de vinho,

Testas brancas sob rosas,

Nus, brancos antebraços

Deixados sobre a mesa;





Tal seja, Lídia, o quadro

Em que fiquemos, mudos,

Eternamente inscritos

Na consciência dos deuses.





Antes isto que a vida

Como os homens a vivem

Cheia da negra poeira

Que erguem das estradas.





Só os deuses socorrem

Com seu exemplo aqueles

Que nada mais pretendem

Que ir no rio das coisas.



Ricardo Reis



Assim Como

Assim como falham as palavras quando querem exprimir qualquer pensamento,
Assim falham os pensamentos quando querem exprimir qualquer realidade,
Mas, como a realidade pensada não é a dita mas a pensada.
Assim a mesma dita realidade existe, não o ser pensada.
Assim tudo o que existe, simplesmente existe.
O resto é uma espécie de sono que temos, infância da doença.
Uma velhice que nos acompanha desde a infância da doença.

Alberto Caeiro


Não sei quantas almas tenho

Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo : "Fui eu ?"
Deus sabe, porque o escreveu.

Fernando Pessoa

quinta-feira, junho 12, 2008

Jim Morrisson


Sol, sol, sol
Brasa, brasa, brasa,
Luar, luar, luar,
Vou pegar em ti
Já!
Já!
Já!
Sou o Rei Lagarto
Sou todo-poderoso.

íamos descendo
rios & estradas
íamos descendo
florestas & açudes
íamos descendo
de Carson & Springfield
íamos descendo
De Fénix cativa
& sei dizer-te
Os nomes do Reino
Sei também dizer-te
Tudo o que tu sabes
Escutando um punhado de silêncio
trepando pelos vales rumo à sombra.

Jim Morrison
Uma Oração Americana e Outros Escritos
assírio e alvim